O FORTE DA GRAÇA- Do nascimento à ruína XI
Elvas e o Forte da Graça no tempo das Invasões Francesas
“Preciosa achega do conhecido historiador de Elvas, Dr. Amílcar Morgado”
Como é sabido, os trabalhos de construção do Forte da Graça ficaram concluídos em 1793. Oito anos volvidos, surgiria a primeira oportunidade de pôr à prova tão importante obra de arquitectura militar.
De facto, o governo português recusara aceder, às exigências de Napoleão Bonaparte para nos afastarmos da Inglaterra, país de que éramos tradicionalmente aliados e que o imperador francês queria derrotar militar e economicamente a todo o custo.
Perante a recusa de Portugal em aceitar a intromissão de Napoleão na nossa política interna e internacional, este assinou com a Espanha uma convenção secreta, em Abril de 1797, para conquista do nosso país. Embora a guerra tivesse estado, então, iminente, por circunstâncias várias só veio a deflagrar em 1801, 4 anos mais tarde. Assim, em Maio desse ano, um exército espanhol invadia Portugal por vários pontos ao longo da fronteira comum e, no dia 20, apresentava-se em frente de Elvas, intimando o general governador D. Francisco de Noronha a render a praça, o que este repeliu com patriótica altivez, seguro como estava da solidez das suas fortificações e dos homens que as guarneciam. Após breves dias de cerco e em face da resposta altiva do governador, em contraste com outros chefes militares que se entregaram quase sem combater, o inimigo retirou-se, não se tendo registado mais do que escaramuças.
Dado, porém, que noutros pontos do país o nosso exército sofreu várias humilhações por se encontrar desorganizado e ainda sem auxílio dos ingleses, o Príncipe Regente foi forçado a negociar a paz através do tratado de Badajoz. A troco dessa paz fomos obrigados a ceder Olivença e a pagar uma pesada indemnização em dinheiro.
As exigências de Napoleão, entretanto, continuaram e, na sequência do tratado de Fontainebleau, a invasão do território nacional por tropas franco-espanholas, consumou-se.
Assim, e reconhecida a inutilidade de um banho de sangue, em 1 de Dezembro de 1807, Elvas e os seus fortes foram ocupados sem luta por tropas espanholas que ficaram a governar conjuntamente com as portuguesas. Não tardou muito, porém, para que o desentendimento grassasse entre os invasores espanhóis, com o procedimento de Napoleão para com eles, pelo que, no ano seguinte, os franceses os vieram substituir.
O governo da Praça foi, então, assumido, por um coronel francês e o Forte da Graça por um capitão, filho do mesmo coronel.
Entre as medidas que tomaram de imediato, conta-se a redução das tropas portuguesas através do licenciamento dos militares que já tinham terminado a sua obrigação de serviço. Com os restantes organizaram alguns corpos que foram depois mandados para França, construindo a Legião Lusitana dos exércitos de Napoleão.
Os portugueses, que haviam recebido sem luta as tropas comandadas por Junot, logo que estas começam a cometer todo o tipo de abusos, revoltaram-se.
A onda de ódio contra os franceses, que dia a dia ia aumentando, agravou-se mais depois de sufocada a revolta de Évora, a que se seguiu terrível saque pelas tropas do general Loison que, de passagem por Elvas, aqui deixou como governador o seu ajudante de ordens. Este, conhecedor de alguns actos praticados por patriotas, alertou o Juiz de Fora e a Câmara para o que se estava a passar, pedindo que tomassem as medidas convenientes para evitar ter de usar os rigores das leis militares.
Já então as tropas inglesas tinham vindo em nosso socorro, sob o comando do general Wellesley, que derrotara Junot no Vimieiro. Assinada a Convenção de Sintra, foi permitida a retirada dos invasores com armas e munições.
Poucos dias depois desta derrota dos franceses, o general Galluzzo, comandante de uma divisão espanhola, intimava o comandante das tropas francesas estacionadas em Elvas a retirar-se. Este recusou-se. Imediatamente saiu de Badajoz uma divisão (os espanhóis estavam agora contra os franceses) que pôs cerco ao Forte da Graça. No dia seguinte, perante nova intimação, o coronel voltou a recusar-se. Além da recusa, atreveu-se ainda a escrever ao Bispo, ao Juiz de Fora e ao Senado da Câmara, fazendo várias exigências quanto à segurança dos franceses hospitalizados e ao fornecimento de carne, palha e outros géneros para as guarnições francesas dos fortes e Santa Luzia e da Graça, além de um empréstimo pecuniário. Ameaçava, ainda, bombardear a cidade aos primeiros disparos contra as tropas.
Perante esta situação, as autoridades civis de Elvas, juntamente com o Bispo, tentaram obter dos espanhóis a suspensão das hostilidades para evitar uma possível destruição da cidade pela artilharia do forte.
A resposta dos espanhóis, porem, foi firme: se os franceses não se rendessem num prazo de seis horas, abririam fogo e as guarnições seriam passadas pelas armas. Entretanto, todos os militares franceses ainda na cidade se haviam acolhido já no forte a Graça. Assim, terminado o prazo, começou o bombardeamento que se prolongou por dois dias. Ao terceiro dia apareceu um contingente de tropas inglesas, à vista do qual os franceses resolveram render-se.
Suspenso o bombardeamento, foi grande a satisfação dos elvenses, por verem capitular os franceses, tendo organizado de imediato uma junta provisional de governo, presidida pelo Bispo, que procurou pôr em funcionamento a ordem pública, tentando evitar, sobretudo, as vinganças contra aqueles que haviam colaborado com os invasores. Durante a 2ª e 3ª invasões Elvas não voltou a ser ocupada.
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Jornal Linhas de Elvas
Nº 2.275 – 25 – Novembro – 1994
Conversas Soltas
publicado às 20:07